quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Estaremos surdos aos apelos do Ser em nós?

LIÇÃO 336

O perdão me permite saber que as mentes são unidas.

1. O perdão é o meio designado para o fim da percepção. O conhecimento se restabelece depois que: primeiro, a percepção se modifica para, em seguida, dar lugar àquilo que permanece para sempre além de seu alcance mais elevado. Pois imagens e sons podem servir, no máximo, para despertar a memória que está além de todos eles. O perdão varre as distorções e abre o altar escondido à verdade. Seus lírios refletem a luz para o interior da mente e a chamam para voltar e olhar para dentro, para encontrar aquilo que ela procura fora inutilmente. Pois aí, e só aí, se restabelece a paz de espírito, pois essa é a morada do Próprio Deus.

2. Possa o perdão varrer meus sonhos de separação e de pecado na paz. Deixa-me, então, meu Pai, olhar para dentro e achar Tua garantia de que minha inocência se mantém; Tua Palavra permanece inalterada em minha mente, Teu Amor ainda habita em meu coração.

*

COMENTÁRIO:

"... vivemos, de modo incorrigível, distraídos das coisas mais importantes", diz-nos Guimarães Rosa em uma das estórias de seu livro Primeiras Estórias. E em algum outro lugar, noutro livro, que "... o melhor da vida, mesmo, são os desacontecimentos importantes". Claro que a atenção que damos às coisas é que as tornam mais ou menos importantes. Mesmo os "desacontecimentos".

E, se pensarmos bem, chegaremos a esta mesma conclusão, ainda que por caminhos diferentes. Ou será que temos consciência do momento em que deixamos de perceber, de saber, que "as mentes são unidas"? Em que momento passamos a acreditar na ideia de separação?

É claro que este mundo de aparência em que acreditamos estar, e que cremos ser real e verdadeiro, nos oferece uma avalanche de informações e de coisas, e de provas de sua realidade, que muitas vezes nos atordoa e exige um esforço sobre-humano até para respirar de forma tranquila e pensar de forma clara.

A ideia de uma possível aceleração do tempo já não permite a alguns de nós - muitos, quem sabe, a maioria - o contato com momentos de calma, de tranquilidade, de serenidade e de paz. Um momento para se estar no presente, consciente do aqui e do agora apenas, uma vez que o tempo é apenas uma ideia.  

Acostumados a se sentirem atropelados pelas exigências do mundo que criaram, esqueceram-se de si e se abandonaram à ideia de que são aquilo que sua atividade os leva a fazerem. E à de que, se não fizerem o que fazem, não se reconhecerão mais.

Outros apenas não concebem a ideia de parar. Assusta-os a ideia de sentar-se calmamente para olhar para uma paisagem qualquer, ouvir uma música com atenção, ou mesmo para olhar, num banco de uma praça qualquer, aqueles que passam apressados, correndo, correndo, indo de um lugar para outro sem a menor consciência de que só há um lugar para o qual precisamos ir.

O poeta Juan Ramon Jimenez, citado por Roberto Crema no livro Normose diz: "Não corras. Não tenhas pressa. Aonde tens de ir é só a ti". E nós nos recusamos a ouvir, preferindo acreditar que a pressa e a correria vão nos levar a algum lugar.

As práticas da ideia desta sexta-feira, dia 2 de dezembro, podem, se nos permitirmos, quem sabe?, abrir nossos olhos e ouvidos à percepção verdadeira, libertando-nos da tirania a que nos submetemos neste mundo que construímos a cada pensamento, a cada instante.

Um amigo poeta, Ruy Proença, chama a atenção, em um de seus poemas, para o quanto nos tornamos surdos aos apelos do Ser em nós. O poema se chama Tiranias:

antigamente
diziam: cuidado
as paredes têm ouvidos

então 
falávamos baixo
nos policiávamos

hoje
as coisas mudaram:
os ouvidos têm paredes

de nada
adianta 
gritar


NOTA: Repetição com pequenas modificações do comentário do ano passado.



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